PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DIANTE DA IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS AMBIENTAIS: CASO DO PROJETO MINERÁRIO VOLTA GRANDE

Resumo

Este caso, apresentado pela Defensoria Pública do Estado do Pará, trata de direito ambiental e da atuação da Defensoria Pública, mediante ações de educação para direitos, ajuizamento de ações, atuação extrajudicial nos licenciamentos ambientais e elaboração de recomendações, na defesa dos povos e comunidades afetadas quando há a implantação de grandes projetos para o desenvolvimento do país que geram impactos. Na apresentação detalhada do caso, está disponível, também, a decisão interlocutória proferida em uma das ações ajuizadas.

O Caso

Nome da/o(s) Participante(s):
Andreia Macedo Barreto – Doutora em Direitos Humanos – UFPA, e Pós-Doutoranda

Instituição/Organização/ Movimento Social:  Defensoria Pública do Estado do Pará

Estado: Pará

I – Resumo da Situação-Problema:

Os investimentos brasileiros em obras de infraestrutura, geração de energia ou incentivos a projetos de exploração econômica de recursos naturais (como a mineração) são considerados estratégicos para manter ou potencializar um ritmo e padrão de crescimento no Brasil. Todavia, parte desses empreendimentos afetam diretamente povos indígenas, comunidades remanescentes de quilombo, comunidades tradicionais, rural e urbana, consideradas hipossuficientes, causando-lhes impactos na moradia, nas relações familiares, ao modo de vida, território, restringido o acesso aos recursos naturais (caça, pesca e acesso à terra), com consequências negativas na educação, transporte público e à sadia qualidade de vida, inclusive com exposições a danos ambientais. Apesar das exigências ambientais e submissão ao licenciamento ambiental, esses empreendimentos causam impactos socioambientais.

O licenciamento consiste em importante instrumento de gestão da Política Nacional de Meio Ambiente, destinado a avaliar a localização, implantação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que possam causar degradação ambiental. No cenário de intervenção ambiental de empreendimentos que causam impactos socioambientais, tem-se o caso do empreendimento minerário denominado Volta Grande, em área já impactada pela Hidrelétrica Belo Monte.

A hidrelétrica denominada Belo Monte é considerada a maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal. Construída na Bacia do rio Xingu, em sua parte paraense, Belo Monte tem como área de influência os municípios de Altamira, Vitória do Xingu e Brasil Novo, mas seus impactos alcançam outros municípios localizados no Oeste do Estado do Pará, como é o caso de Senador José Porfírio. Na área de impacto ambiental da hidrelétrica está o Projeto de mineração denominado Volta Grande, cujo procedimento de licenciamento ambiental em tramitação na Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS), a requerimento empresa Belo Sun Mineração Ltda., que é uma subsidiária brasileira da Belo Sun Mining Corporation pertencente ao grupo Forbes & Manhattan Inc., um banco mercantil de capital privado que desenvolve projetos de mineração em todo o mundo. Trata-se de empreendimento minerário de ouro, situado na área rural do município de Senador José Porfírio, estado do Pará, considerado de grande porte, com capacidade estimada para produção de 50 toneladas de ouro em 12 anos de funcionamento. Este projeto prevê uma operação de lavra a céu aberto por meio de bancadas utilizando, posteriormente, uma rota de processo tradicional no beneficiamento do minério de ouro.

Diante dessa dualidade entre implantação de empreendimentos para o desenvolvimento do país e impactos socioambientais, a Defensoria Pública exerce importante papel na defesa dos povos e comunidades afetadas, a maioria residente na área de interesse de implantação desses empreendimentos. Esse papel é também decorrente de sua função socioambiental, a qual perpassa tanto pela tutela do ambiente, como direito difuso; como pela defesa e proteção de direitos individuais e coletivos de hipossuficientes impactados direta ou indiretamente, por dano ou intervenção ambiental. A função socioambiental da Defensoria Pública implica na promoção ampla e defesa do direito fundamental de hipossuficientes, o que alcança o direito ao meio ambiente equilibrado.

No direito positivo atual, dentre outros dispositivos, essa função pode ser extraída das disposições do artigo 134 e artigo 225 caput e seu § 1º da Constituição Federal, em análise conjunta com o inciso X do artigo 4º da Lei Complementar 80/1994, disposição introduzida pela Lei Complementar nº 132/2009, que alterou e reforçou em norma infraconstitucional o papel da Defensoria Pública na defesa dos direitos fundamentais ambientais, o que alcança também a promoção da cidadania, a dignidade da pessoa humana, o combate à pobreza, marginalização e desigualdades sociais.

II – Resumo da Ação e/ou Medidas Judiciais; Extrajudiciais e/ou Políticas Adotadas:

Diante dos impactos socioambientais, que afetam o direito de moradia, alimentação e trabalho dos diretamente impactados, a Defensoria Pública do Estado do Pará atua de forma estratégica no curso do licenciamento ambiental, considerando seu papel socioambiental, de forma cooperada com organizações governamentais (Universidade Federal do Pará, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual e Defensoria Pública da União) e organizações não governamentais (Instituto Socioambiental e Xingu Vivo Para Sempre), além de grupos representativos dos atingidos, como Associação de Moradores, Cooperativa de Garimpeiros, que também são assistidos pela Defensoria Pública.

  1. Atuação extrajudicial no curso do Licenciamento Ambiental. Diferentemente do Ministério Público, a Defensoria Pública não integra o Conselho Estadual de Meio Ambiente do Pará (COEMA), nem tem participação opinativa no trâmite do licenciamento, ou seja, o órgão licenciado não encaminha o processo de licenciamento para parecer da Defensoria. Por isso, sua participação nos trâmites do licenciamento depende muito do acesso ao procedimento do licenciamento ambiental pela própria Defensoria, momento que analisa a legalidade do procedimento e promove a proteção de hipossuficientes envolvidos, garantindo o acesso à informação, participação, publicidade e legalidade, que irá desencadear ou não na viabilidade do empreendimento, sua instalação e seu funcionamento. No Pará, partindo dessas premissas, a Defensoria Pública do Estado atua intervindo diretamente no processo de licenciamento ambiental do Projeto Minerário Volta Grande expedindo recomendação para observância do princípio da publicidade, participação e observância dos requisitos de oitiva popular nas audiências públicas. Nessa atuação, contou com a parceria com a Universidade Federal do Pará, que emitiu parecer técnico multidisciplinar. Na audiência pública, a Defensoria também expediu recomendação apontando as áreas diretamente afetadas. Por isso, recomendou ao órgão licenciador incluir comunidade rural como diretamente afetada ao empreendimento nos estudos de impacto ambiental.
  2. Parcerias com organizações não governamentais. A atuação estratégica também inclui reuniões e articulações com organizações não governamentais envolvidas na orientação e mobilização social, como Xingu Vivo Para Sempre, Comissão de Ribeirinhos Atingidos por Belo Monte, Comissão Indigenista Missionário (CIME), Movimento de Mulheres, Movimento Negro. Nesse sentido, no ano de 2017, a Defensoria Pública também se fez presente na reunião de Planejamento Anual do Movimento Xingu Vivo Para Sempre. Além da intervenção na audiência pública, a Defensoria Pública do Estado também participou das oficinas participativas realizadas pelo órgão licenciado, momento em que pode promoveu a orientação jurídica sobre a condição do licenciamento, visão de presente e futuro das comunidades afetadas, assim como posicionando-se quanto ao empreendimento. Nessa relação e cooperação com Organizações Não Governamentais, a Defensoria Pública oportuniza não apenas sua visão institucional, mas também participa das medidas de mobilização social, orientação jurídica dos envolvidos, aproximando-se de seu público alvo. Essa parceria inclui cooperação com estudos técnicos realizados pelas Organizações Não Governamentais, como os realizados pelo Instituto Socioambiental (ISA), que possui profissionais especializados em diversas áreas do conhecimento (ambientalistas, engenheiros, jornalistas, etc.). A imagem abaixo foi fornecida pelo ISA à Defensoria Pública do Estado, para subsidiar ação judicial em território de comunidades tradicionais, onde a empresa mineradora realiza pesquisas minerárias. Em anexo, parecer Técnico fornecido pelo ISA à Defensoria Pública (e outras instituições), o qual também serviu de subsídio para propositura de ação judicial.
  3. Atuação extrajudicial com atendimento dos impactados na local do conflito. Outra atuação estratégica da Defensoria Pública é se fazer presente nas comunidades impactadas, promovendo a orientação jurídica, de modo a permitir acesso amplo de todos aos serviços prestados pela instituição, que perpassam pela oitiva dos impactados até à expedição de documentos básicos ao exercício da cidadania (Carteira de Identidade, Certidão de Nascimentos, etc.). Com isso, a Defensoria Pública do Pará, desde o início do licenciamento ambiental, realizou atendimento jurídico nas comunidades rurais impactadas, inclusive promoveu a reunião de assinatura de pessoas que exigiam a realização de audiência pública em sua comunidade, no local do conflito, tendo em vista que o órgão licenciado assim não considerava e tinha programado a referida audiência na área urbana do Município. Também promoveu a elaboração de relatório e registro de mídia, durante suas visitas, para adoção de medidas institucionalmente e encaminhamento das denúncias às instituições envolvidas (UFPA, MPF, MPE e DPU), para adoção de medidas necessárias, a partir do âmbito da atribuição institucional de cada uma delas.
  4. Parceria com instituições governamentais. Na atuação da Defensoria Pública a parceria com comunidades científicas também se mostra estratégica, já que existem muitos profissionais em instituições de ensino superior, com conhecimento em diversas áreas: oceanografia, solo, recursos hídricos, antropologia, engenharia florestal, etc. Em anexo, parecer técnico que subsidiou a atuação técnica da Defensoria Pública em diversas fases do licenciamento ambiental. Nessa relação interinstitucional, a ação coordenada com o Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Defensoria Pública da União são primordiais, para uma atuação estratégica, frente à grandes empreendimentos econômicos, como tem ocorrido com o Projeto de Mineração Volta Grande do Xingu e UHE Belo Monte.
  5. Atuação judicial no curso do Licenciamento Ambiental. As relações interinstitucionais com organizações não governamentais e governamentais também permitem uma melhor atuação judicial, que tem a particularidade da expertise do (a) Defensor (a) Público (a) em diversas áreas do conhecimento, que envolve o estudo de pareceres técnicos, oitiva das comunidades e produção de prova com coleta de documentos, vídeos, imagens, etc. Com isso, as ações coletivas, como a Ação Civil Pública e medidas cautelares também se mostram estratégicas na garantia de direitos. É o caso da Ação Civil Pública 0005149-44.2013.814.0005, com tutela provisória deferida (Disponível: https://drive.google.com/file/d/0BymSev7h91aZYkR1NGNPQndQbjg/view), em que a Defensoria Pública do Estado do Pará questiona a compra ilegal de terras e afixação de placas proibitivas da caça e pesca, pela empresa; bem como da Ação Cautelar Antecedente nº 0001062-06.2017.814.0005 (Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0BymSev7h91aZZHFlUzJMV1R1ajA/view), em que a Defensoria Pública do Estado moveu contra a empresa mineradora e o Estado do Pará, requerendo a suspensão do licenciamento ambiental por descumprimento de normas ambientais e fundiárias, no curso do licenciamento. Nessa mesma linha de atuação, a Defensoria Pública também inclui medidas destinadas a garantir os direitos territoriais das populações tradicionais, com a proteção dos direitos à moradia, alimentação e trabalho. É o caso da Recomendação (ANEXO V) e Ação Civil Pública nº 0002333-50.2017.814.0005 (Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0BymSev7h91aZOVd5TTJvQVBHdDQ/view) contra o Estado do Pará e Instituto de Terras do Pará, cujo objeto é a determinação de fazer para a concluir do procedimento de regularização fundiária de populações tradicionais agroextrativistas, que estão ameaçadas pelo projeto minerário volta grande.

III – Parceiros Envolvidos:

Universidade Federal do Pará, Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado do Pará, Defensoria Pública da União, Associações de moradores da Vila Ressaca, Movimento de Mulheres, Movimento Xingu Vivo Para Sempre, Instituto Socioambiental (ISA), Cooperativa de Garimpeiros.

IV – Resumo dos Resultados Obtidos:

Orientação Jurídica do envolvidos; Educação em direitos humanos; Defensoria Pública no local do conflito, próxima às comunidades e seu público alvo; Ações de cidadania em comunidades envolvidas; Recomendações, para a observância da publicidade, participação e legalidade no licenciamento; Mudanças no curso do licenciamento ambiental; Ações judiciais para garantia de direitos territoriais, suspensão de licenciamento, observância de condicionantes em licenças ambientais e observância de direitos sociais dos impactados; Mobilização de comunidades impactadas, em articulação com movimentos sociais; Produção de estudos técnicos, motivados pela Defensoria Pública; Inserção da Defensoria Pública nos debates socioambientais; Reafirmação do papel socioambiental da Defensoria Pública; Visibilidade institucional, nacional e internacional.

V – Documentos

Decisão Interlocutória

GALERIA DE IMAGENS

Organização

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